INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DE NOVA VENÉCIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM LETRAS-HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA, INGLESA/ESPANHOLA E RESPECTIVAS LITERATURAS CLEIDIANE DE SOUZA DUARTE JULHA ARAÚJO DE OLIVEIRA JULIANA CÉLIA CORDEIRO PORTUGUÊS BRASILEIRO: UMA NOVA FORMAÇÃO HISTÓRICA NOVA VENÉCIA PORTUGUÊS BRASILEIRO: UMA NOVA FORMAÇÃO HISTÓRICA Monografia apresentada ao Instituto de Ensino
Superior de Nova Venécia como requisito para a
obtenção de Licenciatura Plena em Letras
Orientadora: Profª Zenilza Bindaco Aksascki
NOVA VENÉCIA CLEIDIANE DE SOUZA DUARTE JULHA ARAÚJO DE OLIVEIRA JULIANA CÉLIA CORDEIRO PORTUGUÊS BRASILEIRO: UMA NOVA FORMAÇÃO HISTÓRICA
Monografia apresentada ao curso de Letras Português, Inglês/Espanhol do Instituto de Ensino
Superior de Nova venécia, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em Letras.
COMISSAO EXAMINADORA Instituto de Ensino Superior de Nova Venécia Orientadora: Profª Zenilza Bindaco Aksascki Dutra Profª Vanessa Tiburtino Instituto de Ensino Superior de Nova Venécia Profª Leida Raasch Instituto de Ensino Superior de Nova Venécia
luz da nossa vida; aos nossos familiares
tentativa de representação é porque
A pesquisa realizada traz em análise a formação da Língua Portuguesa e brasileira
que consistem na mistura de raças e vocabulários decorrentes da evolução
histórica, social e cultural. Com isso, os dados bibliográficos comprovaram que a
nomenclatura exigida pela gramática tradicional depara-se com a língua falada que
é continua, sendo que a diglossia existente na língua diferencia as classes sociais e
possibilita a teoria sociolingüística de estudar a oralidade e suas variações de modo
a estabelecer um paradigma da língua materna com a falada. Por essa questão, os
mitos comparativos entre o falar português e brasileiro fortalecem a concepção de
que nenhuma língua é superior ou inferior à outra, cabe ao falante adequar-se a
sua realidade para dispor o seu discurso.
PALAVRAS-CHAVE: Gramática tradicional e linguagem falada.
SUMÁRIO INTRODUÇÃO.09 APRESENTAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO . 09
1.2 JUSTIFICATIVA DA ESCOLHA DO TEMA. 09 1.3
1.5.1 OBJETIVO GERAL .11 1.5.2 OBJETIVO ESPECÍFICO . 11 1.6
HIPÓTESES OU SUPOSIÇÕES DE ESTUDO . 11
APRESENTAÇÃO DO CONTEÚDO DOS CAPÍTULOS . 13
REFERENCIAL TEÓRICO . 14
2.1 A LÍNGUA PORTUGUESA E SUA FORMAÇÃO HISTÓRICA . 14 2.1.1 A FORMAÇÃO DA LÍNGUA “BRASILEIRA” . 16 2.2 GRAMÁTICA: A ARTE DE ESCREVER . 19 2.3 O QUE É MAIS DIFÍCIL: A LÍNGUA OU A GRAMÁTICA NORMATIVA? . 24 2.4 A LÍNGUA FALADA COMO INSTRUMENTO DE ASCENSÃO SOCIAL . 27 2.4.1 O DISCURSO E SUA IDEOLOGIA DOMINANTE . 29 2.5 DIGLOSSIA: LÍNGUA FALADA E LÍNGUA ESCRITA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO . 31 2.6 SOCIOLINGÜÍNGUISTICA . 35 3 CONCLUSÃO . 38 REFERÊNCIAS . 39 1 INTRODUÇÃO
1.1 APRESENTAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO Sob a perspectiva de uma análise sociolingüística, a oralidade torna-se um instrumento de comunicação centrado nos pressupostos da evolução e variação das palavras no decorrer do tempo. Ao observar as transformações do latim ao registro da língua portuguesa, será realizada uma análise da formação histórica Lusitânia comparada ao falar brasileiro, objeto de estudo deste trabalho. Partindo dos estudos lingüísticos de Bagno (2005) em “Português ou Brasileiro: Um Convite à Pesquisa” pretende-se verificar o conceito e o pré-conceito da gramática tradicional e o que ela propôs à linguagem falada, para então, estabelecer as diferenças entre linguagem, língua e fala acentuadas também por Terra (1997). Através de Magda Soares (2002) perceber-se-á a deficiência da escola em relação ao aprendizado da língua materna que resulta na diglossia da língua brasileira analisada também por Perini (2002) e Bagno (2005). Assim, a aceitação de uma linguagem dominante e ideológica será abordada por Fiorin (2000) que analisa o fator discurso como determinante no que diz respeito à categoria do falante no ato comunicativo. 1.2 JUSTIFICATIVA DA ESCOLHA DO TEMA O desenvolver da presente pesquisa dá-se pela necessidade de mostrar o preconceito da gramática tradicional quanto à linguagem falada, que é amparada pela Sociolingüística, cujo estudo envolve a fala e suas variedades, a fim de que se possa compreender o português brasileiro e a diglossia que nele existe.
1.3 DELIMITAÇÃO DO TEMA O objeto de estudo desse projeto é o falar português brasileiro que constitui duas línguas: a fala da escrita. De acordo com a analise histórica, social e cultural da formação da língua portuguesa, especificamente a transformação das palavras no decorrer do tempo, serão exploradas a gramática tradicional e a língua falada como fatores imprescindíveis da linguagem humana. Este trabalho delimita-se, ainda, em abordar a oralidade como instrumento de ascensão social, tendo em vista o discurso dominante que inclui uma linguagem padrão privilegiada pela gramática normativa e que impõe certa autonomia diante das camadas sociais, mas é desconsiderada ideologicamente. 1.4 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA De acordo com a abordagem apresentada far-se-á uma relação entre o poder da fala e a norma da escrita. É interessante observar a oralidade como um instrumento de persuasão e convencimento se bem aprimorado gramaticalmente. Entretanto, nem sempre será um fator de ascensão social, pois, uma vez conectada a grafia, seu uso poderá ser modificado. A propósito das diferenças entre ler e escrever destacam-se as variantes e variações que ocorrem na língua. Mediante a fala e a escrita do português brasileiro, há que se questionar a real diglossia da língua escrita e falada e sua compatibilidade com a gramática tradicional.
1.5 OBJETIVOS 1.5.1 OBJETIVO GERAL
Analisar o português brasileiro através de sua formação histórica e a partir dessa análise compreender a existência da diglossia na língua.
1.5.2 OBJETIVO ESPECÍFICO • Examinar e comparar os processos da evolução da língua; • Descrever a dicotomia entre fala e escrita; • Citar os fatores que influenciam as variantes na fala; • Analisar a língua falada como um fator de ascensão social.
1.6 HIPÓTESES OU SUPOSIÇÕES DE ESTUDO A evolução e transformação histórica do Latim desencadearam a formação das línguas neolatinas, dentre elas, o Português que continua a sofrer alterações em seu uso, pois o léxico Lusitano obedece às regras alexandrinas da gramática normativa; já no Brasil o modelo padrão é ensinado nas escolas, porém a língua falada é constituída de variações onde o domínio gramatical não é utilizado com propriedade pelo falante. Desde os primórdios que a comparação entre a norma culta e a fala são analisadas. Daí a hipótese da existência de duas línguas: a oral e a escrita. As vinculações entre o homem e a linguagem emergem a concepção de que a mistura de raças ocasionou o falar português brasileiro. Assim, passou-se a considerar que
a estrutura padrão exigida pela gramática diferencia as classes sociais e omite as variações da língua falada. Vale lembrar que, para cada momento e local, o indivíduo usará diferentemente seu vocabulário. Se um determinado falante nunca foi à escola, seu nível de comunicação não estará no conceito pré-estabelecido pela gramática, mas será chamado de erro. Ao contrário do que diz a lingüística que todo falante tem sua gramática internalizada e a usará de acordo com sua realidade, obtendo uma ideologia de vida. 1.7 METAS A proposição primordial dessa pesquisa restringe-se à formação do português brasileiro tendo em vista a estrutura gramatical em desconsiderar as variações que ocorrem na língua falada, e dessa forma, refletir se o ensino da língua está vinculado com a realidade do indivíduo. 1.8 METODOLOGIA 1.8.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA O presente trabalho está amparado na pesquisa bibliográfica, com dados históricos e atuais do português brasileiro que expõe o conhecimento e a contribuição dos autores sobre o tema proposto. 1.8.2 COLETA E TRATAMENTO DE DADOS Far-se-á uma comparação quantitativa dos dados encontrados nas referências bibliográficas, a fim de esclarecer e comprovar o processo transformacional das línguas que desencadeou o português brasileiro. 1.8.3 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
Os estudos realizados sobre o tema proposto foram de suma importância para quantificar as informações históricas e da atualidade que, comprovadas através das referências bibliográficas, mostram a real diglossia na língua, sendo que a gramática além de atuar também na oralidade se sobressai na escrita; já a fala é a amparada pela sociolingüística. A partir da teoria variacionista, a análise dos pressupostos será destacada pelas influencias e interferências na dinamicidade do discurso, que dependerão de fatores socioeconômicos registrados na categoria do falante em adequar a funcionalidade da língua para se estabelecer na sociedade. Assim, esse estudo limita-se em registro bibliográfico. Novas pesquisas poderão ampliar ou alterar os resultados obtidos. 1.9 APRESENTAÇÃO DO CONTEÚDO DOS CAPÍTULOS O primeiro capítulo trata da introdução onde contém a justificativa, a delimitação do tema, a definição do problema, o objetivo geral e os específicos, a hipótese e as metas da pesquisa assim como a metodologia utilizada. O segundo capítulo refere-se ao referencial teórico, ou seja, apresenta todos os estudos realizados em relação ao capítulo anterior considerando a análise sociolingüística da fala e a gramática tradicional do português brasileiro. Por fim, o terceiro capítulo faz a análise conclusiva, reflexão e sugestão de novos resultados a serem obtidos por outras pesquisas tendo como fonte embrionária este trabalho.
2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 A LÍNGUA PORTUGUESA E SUA FORMAÇÃO HISTÓRICA O ponto de partida de todas as línguas neolatinas foi o Latim, falado pelo povo romano do século XVIII, onde se caracterizou por várias transformações conforme a época. Nesse período o Latim classificou-se em: Pré-histórico - língua falada pelos primeiros habitantes da tribo; Proto-histórico – que apareceu nos primeiros documentos da língua; Arcaico – que se caracterizou pobre, mas que com as transformações enriquecera- se graças ao desenvolvimento da literatura e também a influência da cultura helênica; Clássico – caracterizou-se pela língua artística; Vulgar – língua falada pelos soldados e camponeses; Pós-clássico – representado pelas obras literárias dos séculos I e V. De acordo com as transformações do latim, a língua escrita era representada pela minoria da sociedade romana, marcada pelos literatos e o clero. Neste mesmo período, aconteceram as guerras Púnicas, delimitando o território. A massa da sociedade apresentava-se no latim arcaico e latim vulgar, caracterizado por variações no seu vocábulo, devido a questões territoriais, políticas, econômicas e culturais. O latim vulgar é a prova real da oralidade da língua falada, principalmente pelos soldados romanos que faziam intercâmbio comerciais e demarcação de territórios, utilizando uma linguagem popular. Com a fusão das línguas já existentes, as palavras sofreram mudanças fonológicas, morfológicas e sintáticas. Podemos observar as transformações do latim vulgar para o português conforme:
As palavras portuguesas conservaram a mesma acentuação do Latim – o acento tônico guarda a unidade da palavra, é a sua alma. Alguns verbos da segunda conjugação (ére) passaram à quarta (ire) – latim vulgar: Latim clássico
Alguns vocábulos sofreram transformações fonéticas, conservando a mesma significação, chamados de Metaplasmos: alterações que as palavras sofreram na evolução do Latim para o Português: Epêntese: acréscimo de um fonema no meio da letra: Planu>prão>porão Blata> brata>barata Prótese: é o acréscimo do fonema no início do vocábulo: Stare>estar Spiritu>espírito Scutu>escudo Metaplasmos por transformações: Nocte>noite Regnu>reino Multu>muito As conquistas romanas fizeram do latim a língua oficial, usada nos cartórios, correios, tribunais, obrigatória no comércio, atos oficiais e militares, pois segundo Cardoso (2002, p. 09) “Nos locais culturalmente menos desenvolvidos a língua de
Roma, divulgada por soldados e ensinada nas escolas, foi implantada sem maiores dificuldades”. O latim sofreu uma ruptura com a invasão dos bárbaros, transformando-se em línguas românicas ou neolatinas que são o Português, o Francês, o Italiano, o Espanhol, o Provençal e o Romeno. O Português durante a evolução do Latim, distinguiu-se em várias etapas: o latim lusitano, o romance lusitano, português proto-histórico, português arcaico e português moderno, tendo a oficialização da gramática portuguesa em 1536 de Fernão de Oliveira, denominada a Gramática da Lingoagem Portuguesa. A língua Portuguesa foi se expandindo, demarcando os territórios conquistados na África, América e Oceania. O Português a passou ser a língua de comunicação dos colonos, confrontando com os dialetos existentes nas regiões. No Brasil, a situação não foi diferente, pois a mistura entre as raças indígena, negra e branca favoreceu ao ritmo acelerado de uma língua independente, ou seja, por mais que a língua portuguesa fosse oficial no país, sua dicção e influência divulgaram a estrutura brasileira de se expressar, a ideologia de libertação e a sua cultura. 2.1.1 A FORMAÇÃO DA LÍNGUA “BRASILEIRA” Segundo Bagno (2005, p.44) “depois que o navegador português Vasco da Gama descobriu (em 1497) o caminho marítimo para as Índias, o mundo nunca mais seria o mesmo – o mundo em geral e, mais particularmente, o mundo da língua portuguesa”. A mistura da língua indígena, européia e negra, marcou uma nova formação que seria a “língua brasileira” dos dias atuais. A Língua Portuguesa foi utilizada como língua de comunicação, de intercâmbio no comércio, possibilitando a transformação dos vocábulos e a cultura. Foi instrumento de dominação, utilizada na alfabetização, etc.
Elia (2001, p.16) chamou de “Lusitânia ao espaço geolíngüístico ocupado pela língua portuguesa, no conjunto de sua unidade e variedades”. Estão presentes nestes espaços, as regiões que ocorreram à colonização, como: Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe. O Brasil foi chamado por Elia de “Lusitânia Nova” que, segundo ele, não teve o mesmo traço sociolingüístico das outras regiões, pois a língua portuguesa não seria a “língua berço“ e sim “língua transplantada“. Na verdade, já existia uma língua presente, a indígena. Elia (2001) diz que as línguas indígenas existentes no Brasil eram aproximadamente 350 na época de Cabral. Segundo os dados do Professor Rodrigues (apud ELIA, 2001, p.22) ”falam-se no Brasil [.] umas 170 línguas indígenas”. Em seguida diz: “é provável que na época da chegada dos primeiros europeus ao Brasil, há quase quinhentos anos, o número das línguas indígenas fosse o dobro do que é hoje”. As tribos falavam o Tupi e o Macro-Jê, algumas comunidades viviam isoladas das outras. No Amazonas se destacavam as famílias guaicuru, nhambiquara, txapacura, pano, mura, catuquina, dentre outras. Segundo Rodrigues (apud ELIA, 2001, p.22) o tronco Tupi levou a língua geral que “[.] foi inicialmente usada pelos portugueses e espanhóis, para qualificar línguas indígenas de grande difusão numa área”, onde mais tarde se firmou a “língua brasílica”. Logo, Rodrigues (apud, ELIA, 2001, p. 23) declara:
Foi nas áreas mais afastadas do centro administrativo da Colônia [que era
a Bahia] que se intensificou e generalizou o uso da Língua Brasílica como
língua comum entre os portugueses e seus descendentes –
predominantemente mestiços – e escravos [inclusive africanos], os índios
Tupinambá e outros índios incorporados às missões, às fazendas e às
tropas: em resumo, toda a população, não importa qual sua origem, que
No Brasil colonial não existia unidade de língua, e sim diversidade de falares, por isso chamada “língua transplantada”. A língua utilizada pelos jesuítas era o Koiné, de base Tupi, onde se aprendia os ensinamentos de dominação religiosa. Por Câmara Jr (apud, ELIA, 2001, p. 24):
Por isso, o Tupi que as primeiras exposições dos europeus nos fornecem
não é exatamente aquele que os indígenas exatamente falavam: é uma
sistematização simplificada, feita para se proceder à propaganda religiosa
Pode-se perceber que, ao mesmo tempo em que a língua portuguesa era absolvida pelos indígenas, os Jesuítas também utilizavam a língua indígena para se comunicar.
Com a chegada dos escravos, a cultura e os vocábulos africanos modificaram ainda mais a estrutura sociolingüística. Os negros tinham origem sudanesa e outra de origem banto. Nos estudos feitos por Spina (apud, ELIA, 2001, p. 25):
A migração negra para o Brasil teve dois focos principais de procedência,
correspondentes aos dois grandes grupos: os sudaneses, oriundos da
região compreendida pelo Golfo da Guiné, o Senegal e a Nigéria; e os
bântus, originários do Congo, de Angola, de Moçambique e parte do sul
As línguas africanas tiveram uma grande repercussão na Bahia, o nagô ou iorubá; e no Rio de Janeiro e Minas Gerais, o quimbundo. Atualmente é na Bahia que mais se destaca a cultura negra. Segundo Elia (2001), das línguas africanas a que mais teve ligações históricas, raciais e culturais com o Brasil foi a Angola, pois foi a grande fornecedora de “peças”, ou seja, escravos. Em Angola, existiam numerosa línguas naturais, sendo assim uma nação plurilíngüe. A Língua Portuguesa ficou denominada pelo governo como “Língua veicular”. A professora Guerra (apud, ELIA, 2001, p. 33) ressalta que “no momento atual, a língua portuguesa é uma língua oficial, veicular e de escolaridade. É um instrumento de comunicação que ajuda a criança a introduzir-se no universo técnico-científico e revolucionário”. Em Angola os traços sociolingüísticos do português classificaram-se em: língua transplantada, língua veicular, língua oficial e língua de cultura. Segundo Elia (2001, p. 34) “não pode, entretanto, ainda ostentar os qualificativos de línguamaterna (a não ser de forma reduzida), nem de línguanacional”.
A Língua Portuguesa ficou conhecida como língua de acesso à cultura, à ciência, língua como forma de libertação, etc. Para Maria Augusta Henriques (apud, ELIA, 2001, p. 41): “(.) o português é encarado como a língua oficial, é encarado como a língua do saber científico, é encarado como língua de comunicação internacional”. A língua indígena por mais que não tenha registro manuscritos, ficou marcada em nossa oralidade. Com tantas transformações sociolingüísticas, a língua portuguesa deixou de ser língua transplantada e passou a ser língua Nacional, ostentada pela gramática da Língua Portuguesa, que não incluiu em seus registros as línguas indígenas e negras, causando fragmentações e rupturas na formação e construção das regras e normas gramaticais.
2.2 GRAMÁTICA: A ARTE DE ESCREVER Há mais de dois mil anos os estudiosos dedicaram-se exclusivamente aos chamados “clássicos da língua”. Segundo Bagno (2005, p.15):
Essa tradição começou por volta do século III a.C., na cidade de
Alexandria, no Egito, que nesse tempo era um importante centro de cultura
grega. Os estudiosos da grande literatura clássica da Grécia estavam muito
preocupados em preservar na maior “pureza” possível a língua grega, que
naquela época já estava muito diferente da língua usada pelos maiores
poetas e escritores do passado, entre os quais o mais importante era
Homero, o autor da Ilíada e da Odisséia.
Os estudiosos da época grega resolveram então criar regras para descrever as suas obras clássicas de forma rígida e objetiva, valorizando a linguagem literária. Diante disso, Bagno (2005, p. 15) afirma:
Para alcançar seu objetivo, aqueles estudiosos, chamados filólogos,
resolveram descrever as regras gramaticais empregadas pelos grandes
autores clássicos para que elas servissem de modelo para todos os que, a
partir de então, quisessem escrever obras literárias em grego.
Bagno (2005, p. 15) ainda completa dizendo: “foi assim que nasceu a gramática, palavra que significa exatamente ‘a arte de escrever’”, que na verdade recebeu o nome de Gramática Tradicional (doravante GT). Perceber-se que a classe literária excluiu de suas obras a linguagem oral, valorizando somente a linguagem clássica, pois para o Lyons (apud BAGNO, 2005, p. 15):
(.) incorreu no que ele chama de “dois equívocos fatais”: o primeiro, na
separação rígida entre língua escrita e língua falada; o segundo, na forma
de encarar a mudança das línguas (que é simplesmente mudança, e não
”corrupção”, ”ruína” ou “decadência”, como eles acreditavam – e muita
Para Lyons, esse dois equívocos se uniram para formar o “erro clássico” no estudo da linguagem, erro que se perpetuou durante dois milênios e somente no final do século XIX e início do XX começou a ser criticado e revisto. (BAGNO, 2005, p.16)
Os equívocos levantados por Lyons, mostram que a Gramática Tradicional excluiu a linguagem “falada” e chamou de ”corrupção” o que poderíamos chamar de “variantes”. Bagno (2005, p.16) explica:
(.) ao tipo de sociedade daquela época, em que a cultura letrada era
domínio de um número pequeníssimo de pessoas, que pertenciam à
aristocracia, isto é, à classe que detinha o poder econômico e político e
ditava as normas do que era bom e certo em todos os aspectos da vida
No início, a gramática era utilizada para quem tinha o objetivo de escrever obras literárias, com o tempo, passou a ser exigida também de quem não tinha a intenção de escrever. Bagno (2005, p.17) afirma:
Ao longo do tempo foi acontecendo um fenômeno bastante curioso. A
gramática, que, por opção consciente de seus fundadores, só cuidava da
língua escrita literária, começou a ser usada com um código de leis, como
uma régua para medir todo e qualquer uso oral ou escrito de uma língua.
A Gramática Tradicional transformou-se, então, em um instrumento de dominação e exclusão da pequena parcela da sociedade, criando preconceitos sobre o que é ou não é “língua”. Assim, Bagno (2005, p.18) usa as palavras de Bosco e Blanc dizendo que a GT se transformou na corda usada para separar os blocos dos falantes da língua, delimitando espaços, impondo um minueto, uma corda para organizar o carnaval da língua. Bagno (2005, p.18) identificou a Gramática Tradicional como um “sapatinho de cristal de Cinderela”, “a Gramática tradicional só cabe no pé de alguns escritores, daqueles que por opção estética querem seguir a risca os preceitos tradicionais de uso da língua”. No interior da gramática tradicional encontram-se trechos de obras literárias que servem de exemplo para quem quer aprender a escrever corretamente, há uma concordância entre o sujeito e o predicado oracional. Em termos, para a gramática, é assim que deveríamos falar e escrever.
Os gramáticos e os sociolingüistas, cada um com seu viés, costumam dizer
que o padrão lingüístico é o usado pelas pessoas representativas de uma
sociedade. Os gramáticos dizem isso, mas acabam não analisando o
padrão, nem recomendando-o de fato. Recomendam uma norma, uma
Para Possenti, as gramáticas deveriam abordar exemplos que estivessem na realidade da língua falada e não da língua idealizada. Veja sua citação sobre o poema “Pronominais”, de Osvald de Andrade (apud, POSSENTI, 2001, p. 112): Dê-me um cigarro/ Diz a gramática/ Do professor e do aluno/ E do mulato sabido/ Mas o bom negro e o bom branco/ Da nação brasileira/ Dizem todos os dias/ Deixa disso camarada/ Me dá um cigarro. Possenti (2001, p. 112) segue dizendo:
Quero insistir: ao contrário do que se poderia pensar [.], não sou
anarquista, defensor do tudo pode, ou do vale tudo. Nem estou dizendo
que “Nós vai“ é igual a “Tem muito filho que obedece os pais”. O que estou
fazendo é cobrar coerência, um pouquinho só: se o padrão é derivado do
uso dos bacanas, se os mais bacanas dentre os bacanas são os poetas
consagrados, por que, antes das dez, numa aula de literatura, podemos
curtir seu estilo, e em outra aula, depois das onze, dizemos aos alunos e
aos demais interessados: viram o Drummond, o Murilo, o Machado, o
Guimarães Rosa? Que criatividade!!! Mas vocês não podem fazer como
As gramáticas tradicionais apresentam em seus exemplos obras dos clássicos que para Bagno (2005, p. 19):
[.] os gramáticos renascentistas tentaram “vestir” as línguas nacionais
com as mesmas “roupas“ do latim e do grego. Quiseram, a todo custo, que
as línguas se encaixassem no modelo gramatical pronto, herdado da
Vale lembrar que o objetivo da GT era “escrever“ e que tinha que apresentar “pureza“, no entanto emprega normas e regras incoerentes e contradições. Bagno (2005, p.22) afirma:
[.] a Gramática Tradicional não tem bases
preceitos são o resultado de um processo bastante perverso: a
transformação em dogmas, em “verdades” definitivas, de um conjunto de
especulações filosóficas (“especulação” aqui não tem sentido pejorativo, é
Então, Bagno (2005, p.19) questiona: “qual o problema de aplicar as noções gramaticais do grego e do latim clássico às línguas modernas, como o Português?” Nos estudos feitos pelo autor na gramática de Cipro & Infante sobre o artigo definido e indefinido, ele ressalta:
O artigo indefinido indica seres quaisquer dentro de uma mesma espécie;
seu sentido é genérico. Assume as formas um; uma; uns; umas.
O artigo definido indica seres determinados dentro de uma espécie; seu
sentido é particularizante. Assume as formas o, a; os, as.
Geralmente esses são os conceitos encontrados na GT, porém nem sempre tem o mesmo resultado. Bagno (2005, p. 19) exemplifica:
(2) A mulher tem sido discriminada desde que o mundo é mundo.
(3) Dizem que o brasileiro em geral tem ouvido musical.
(4) Os carros são os maiores responsáveis pela poluição do ar.
Se, como dizem os autores da gramática citada, o artigo definido tem
“sentido particularizante“, qual o homem particular que é mortal? Ora,
todos os homens são mortais. Qual a mulher específica que tem sido
discriminada desde sempre? Nenhuma, mas sim todas as mulheres. Se o
artigo definido tem sentido particularizante, como é possível dizer que o
brasileiro em geral ouvido musical? Quais as marcas e modelos de carros
específicos que poluem o ar? [.] É muito interessante ver que, nos
exemplos acima, o artigo definido equivale a “todo, todos” que, na
nomenclatura tradicional, são classificados como pronomes indefinidos,
quando na verdade o artigo definido e o pronome indefinido TODO agem
como um quantificador, o mais geral de todos, o quantificador universal.
Um outro exemplo citado por Bagno (2005, 20) retirado da gramática de Cegala é o conceito dos pronomes possessivos que “referem-se às pessoas do discurso, atribuindo-lhes a posse de alguma coisa”. Observe os próximos exemplos:
(5) Volta logo, querida! Tua ausência me faz sofrer muito!
(6) Chegou a nossa vez de exigir respeito.
(6) Dá pra você sair da minha frente, por favor?
(7) Indiquei o meu jardineiro para o meu chefe.
Bagno (2005, p.20) explica da seguinte forma:
Alguém pode ter a “posse” de uma ausência? Alguém pode ter a “posse”
de uma vez? Alguém pode ter a “posse” da frente? É possível ter a “posse”
de um jardineiro e de um chefe? Veja a diferença de relação que existe
entre alguém dizer “meu jardineiro” e “meu chefe”. Perceba a distinçãosocial que eu estabeleço automaticamente ao me referir a um jardineiro
como meu (eu pago o salário dele, ele faz o que eu mando) e ao me referir
a um outro homem como meu chefe (ele me dá ordens, ele controla o meu Observa-se que os estudos de Bagno revelam uma nova explicação para os pronomes possessivos, e que a GT também tem os seus equívocos e de acordo com suas regras não é possível enquadrá-las na língua do Português Brasileiro, sem fazer análise do contexto. Bagno (2005, p. 22) mostra uma perspectiva para as novas transformações da gramática:
Em suma, empreender o estudo da gramática das línguas dentro de uma
perspectiva cientifica, de acordo com os conceitos modernos de Ciência.
Para isso, temos de parar definitivamente, de usar e abusar da GT como
se nela estivesse contida a verdade absoluta e incontestável a respeito da
língua, como se ela fosse um conjunto de leis intrinsecamente boas e
justas, como se desobedecer tais leis fosse um “crime” contra a língua.
2.3 O QUE É MAIS DIFÍCIL: A LÍNGUA OU A GRAMÁTICA NORMATIVA?
Antes da comparação entre Língua e Gramática, é preciso estabelecer uma definição e distinção para linguagem, língua e fala. A primeira designa o todo, é universal; já a segunda, é social enquanto que a terceira refere-se ao ato momentâneo, individual. No entanto, todas se interagem de forma que a interdisciplinaridade resulte em comunicação. Embora possam confundir língua e escrita, essas são distintas, pois a escrita é uma mera representação ortográfica da língua.
A língua [.] é a linguagem que utiliza a palavra como sinal de
comunicação. Portanto, a língua é um aspecto da linguagem. Trata-se de
um sistema de natureza gramatical, pertencente a um grupo de indivíduos,
formado por um conjunto de sinais (as palavras) e por um conjunto de
regras para a combinação destes. É, portanto, uma instituição social de
caráter abstrato, exterior aos indivíduos que a utilizam, que somente se
concretiza através da fala, que é um ato individual de vontade e
Os dados anteriores esclarecem as intenções e o pré-conceito estabelecido pela gramática quanto à língua falada. Cabe reforçar o titulo do livro de Bechara: “Ensino da Gramática. Opressão? Liberdade?” Essa indagação remete a respostas ofensivas se perguntadas à maioria do público estudantil. Porém, deve-se levar em conta que a estrutura padrão ensinada na escola é relevante, à medida que o indivíduo necessita aprender para adequar-se melhor às pessoas, lugares e situações diferentes. A gramática como opressão ou liberdade, Bechara (1993, p. 17) destaca:
Acredito que o ensino da gramática normativa resulta na possibilidade de
que dispõe o falante de optar, no exercício da linguagem, pela língua
funcional que mais lhe convém à expressão. Resulta, portanto, da
“liberdade” de escolha que oferece uma língua histórica considerada em
Transformar essa língua funcional no modelo universal para todas as
situações de expressão é um ato de “opressão” tanto quanto privilegiar a
modalidade coloquial e familiar sobre todas as demais línguas funcionais à
A língua perpetuou-se anos sem registro. Com sua veiculação foi preciso padronizar a escrita para que se construísse algo concreto. Mas, ao contrário da oralidade em que o falante usa com propriedade, nas mais infinitas limitações, a escrita aplicou-se às doutrinas gramaticais. Não se pode atribuir, também, a todas as gramáticas comparações irregulares entre a arquitetura normativa e a linguagem informal, isto é, existem variadas gramáticas. Essa variedade que a língua portuguesa proporciona em seu uso, confunde-se com as gramáticas existentes. Embora a chamada GT aprisione os falantes em sua arquitetura coesiva, a gramática internalizada (que cada um possui) o liberta de qualquer estrutura padrão, pois é constituída do conhecimento familiar, e da interação com o meio. Contudo, a faculdade de linguagem é intrínseca, ou seja, de dentro para fora, e a gramática é extrínseca, pois aprimora o discurso falado e textual de seu usuário.
Numa língua, chamamos de intrínsecas as regras que nos permitem a
construção de enunciados inteligíveis (frases gramaticais) e extrínsecas as
regras ditadas pela comunidade para o bom uso da língua. Veja que essas
regras intrínsecas são naturais, isto é, elas pertencem à própria língua,
formando a sua gramática. Já as regras extrínsecas não são naturais, são
convenções de ordem social. (TERRA, 1997, p. 27)
Terra (1997, p. 23), ainda, confirma “é importante notar que o processo de apropriação de uma língua se faz por aprendizagem, que ocorre, como assinalamos, independentemente da escola”.
Mas isso não quer dizer que a gramática não possua regras intrínsecas. À medida que uma criança, por exemplo, começa a aprender a língua efetiva, surgem novas combinações de palavras que aumentam seu conhecimento. A fala é inata, por isso o ser humano tem a capacidade de criar, produzir e modificar mais vocabulários para acrescentá-los ao dicionário. A efetiva comunicação não se dá pela competência lingüística do falante, mas pelo seu desempenho. Lembre-se de que a língua é abstrata e só se concretiza pela fala. (TERRA, 1997, p. 22)
Baseado nessa análise de Noam Chomsky, Terra acentua a credibilidade e responsabilidade que o homem tem para com sua propriedade – a fala. No entanto, a gramática tradicional ignora justamente essa variável lingüística, sendo considerada assim, estática. É difícil aprender a gramática normativa com tanta evolução tecnológica que prioriza a liberdade coloquial da fala e essa gramática que segue com as mesmas regras alexandrinas. Diante desse paradigma, Bagno (2005, p. 65) questiona:
.o que nos resta a fazer em sala de aula? [.] o que nos resta a fazer não
é nenhum resto, mas simplesmente tudo e só o que temos de fazer:
desenvolver a prática da leitura e da escrita, da releitura e reescrita, re-
releitura e re-rescrita, sem a necessidade de decorar nomenclaturas [.]
nem de aprender exercícios mal formulados e incongruentes de análise e
descrição mecânica dos fatos gramaticais.
O objetivo do ensino de língua deve ser estimular a expressão das
experiências dos diferentes sujeitos, permitir que eles assumam sua
palavra, que se tornem sujeitos de seu discurso – não é formar professores
de português nem romancistas e poetas, como o ensino tradicional de
língua parece que vem tentando fazer nos últimos séculos, sem nenhum
sucesso, aliás, porque é muito difícil (trans) formar uma pessoa naquilo que
É lamentável que no Brasil, a escola, lugar fundamental para a pessoa
desenvolver sua capacidade de linguagem, nas aulas de língua
portuguesa, pouco ou nada explore com os alunos as regras intrínsecas da
língua, limitando-se, na maioria das vezes, a impor-lhes uma maneira de
utilizar a língua que julga a única correta.
Partindo do pressuposto que o ensino da gramática na escola vem deteriorizando o conceito de língua, há de se esperar a exigência mecânica no falar e escrever bem por parte de alguns professores aos seus alunos. Com isso, o resultado pode ser a reprovação ou o descaso em relação à disciplina.
É preciso encarar a realidade e fazer desta um artifício para inovações na prática escolar. Como diz Luft (2005, p. 99) “um tal ensino requer professores competentes
e seguros, livres e muito bem informados do que ocorre de novo, no campo das pesquisas de língua e linguagem”.
Vale lembrar que a gramática normativa sendo o aperfeiçoamento da língua independente de regras haverá comunicação. Ou seja, a escrita torna-se importante como um registro do que é falado, mas nem todas as pessoas precisam necessariamente escrever para falar bem, pois “a escrita é sinalização secundária, posterior, e pode nem ocorrer, como é o caso dos povos ágrafos e dos indivíduos analfabetos”. (LUFT, 2005, p. 39)
Assim, quando Luft (2005, p. 39) diz que “[.] a verdadeira linguagem é a fala” ele prioriza o objeto de analise da sociolingüística e descarta a possibilidade de que “é muito difícil falar ou aprender português”, dada à questão de que cada indivíduo tem uma gramática interna e a fala é natural.
Uma língua viva está em constante evolução: dialetos, gírias, neologismos,
estrangeirismos, tudo faz parte dela, dessa ebulição que a mantém
animada. Portanto, ainda que hoje se conseguisse uma gramática explicita
do português brasileiro, digamos da década de 90, em breve ela estaria
desatualizada, e o professor, obrigado a novos ajustes. (LUFT, 2005, p. 98)
Por isso, as variações existentes na língua representam o tempo e espaço de seu uso, faz parte da realidade e da história revelada através da fala.
2.4 A LÍNGUA FALADA COMO INSTRUMENTO DE ASCENSÃO SOCIAL
Antes de direcionar este capítulo, retomemos o conceito de fala, segundo Fiorin (2000, p. 12), “a fala, em si mesma, não sofre qualquer determinação social, pois ela é a simples exteriorização do discurso. É o ato concreto, momentâneo e individual de manifestação da linguagem”. O jogo de idéias coordenadas pelo falante compreende o campo de conhecimentos adquiridos em sua formação social. A oralidade torna-se sua identidade. Com efeito, surgem classificações dos usuários da língua em decorrência do discurso empregado. Assim, o fator discurso assimila a fala como instrumento de ascensão social e determina o preconceito de classes numa sociedade capitalista. A propósito, o lema do sistema é “educação para todos”, porém torna-se incoerente nas ações, ou seja, “não há escolas para todos, e a escola que existe é antes contra o povo que para o povo” (Soares, 2002, p. 09). Ainda, numa perspectiva de socialização do saber, Soares (2002, p.6) afirma:
(.) é a Sociologia que, analisando as situações de força materiais e
simbólicas determinantes de uma sociedade estratificada em classes,
desvenda os pressupostos ideológicos do fracasso das camadas populares
na escola, que é, na verdade, um fracasso da escola; é a Sociologia da
Linguagem que, interpretando as condições sociais da comunicação,
explica as relações de força lingüísticas que atuam na sociedade e,
consequentemente, na escola; é a Sociolingüística que, revelando a
covariação entre os fenômenos lingüísticos e os fenômenos sociais,
identifica diferenças dialetais determinadas pela classe social do falante,
diferenças que, hoje, geram antagonismos numa escola conquistada,
através da democracia do ensino, por classes sociais anteriormente dela
Essa análise educacional comprova o ponto de vista Sociolingüístico dessa pesquisa, onde a língua falada possibilita o indivíduo em sua interação para com o meio e dependendo do seu nível de escolaridade, este poderá obter sucesso ou não em sua vida, uma vez que seu uso esteja de acordo com a prescrição gramatical.
Percebe-se que, nesse contexto, a variável escolaridade torna-se relevante em relação às comunidades de fala. As pessoas que têm acesso à escola são inseridas no padrão estético e moral exigido socialmente. No entanto, as classes desprovidas de ensino, são estigmatizadas pelas comunidades discursivas que restringem a maioria da população por utilizarem a norma coloquial. Dada essa distinção, Mol ica & Braga (2004, p.51) concluem que:
As formas de expressão socialmente prestigiadas das pessoas
consideradas superiores na escola socioeconômica opõem-se aos falares
das pessoas que não desfrutam de prestígio social e econômico; ocorrem
em contextos mais formais, mais elitizados, entre interlocutores que se
transforma em modelos e pontos de referência do bem falar e escrever.
2.4.1 O DISCURSO E SUA IDEOLOGIA DOMINANTE Para melhor entendimento da manifestação consciente e política de um discurso, convém ressaltar seu conceito como “combinações de elementos lingüísticos [.] usadas pelos falantes com o propósito de exprimir seus pensamentos, de falar do mundo exterior ou de seu mundo interior, de agir sobre o mundo”. Fiorin (2000, p. 11), ainda, diz que, “a fala é a exteriorização psicofísico-fisiológica do discurso. Ela é rigorosamente individual, pois é sempre um eu quem toma a palavra e realiza o ato de exteriorizar o discurso”. Assim, a oralidade do ponto de vista sociolingüístico pressupõe uma comunicação de liberdade cultural, pois segundo Fiorin “o homem aprende como ver o mundo pelos discursos que assimila e, na maior parte das vezes, reproduz esses discursos em sua fala”. A respeito da sociolingüística, pode-se dizer que “veio mostrar que toda língua muda e varia, isto é, muda de acordo com o tempo e o espaço, além de variar de acordo com a situação social do falante”. (BAGNO, 2005, p. 43) Atualmente, a língua falada ajusta-se como ponto de partida para exercícios profissionais. O discurso sintático e semântico auxilia o locutor em seu meio de trabalho e, principalmente numa entrevista de emprego. Categoricamente, esse
locutor será beneficiado por obter um nível de fala correspondente à classe dominante. Por isso, Fiorin (2000, p.32) afirma:
Assim como uma formação ideológica impõe o que pensar, uma formação
discursiva determina o que dizer. Há, numa formação social, tantas
formações discursivas quantas forem as formações ideológicas. Não
devemos esquecer-nos de que assim como a ideologia dominante é a da
classe dominante, o discurso dominante é o da classe dominante.
A fala, interdependente da língua, desenvolve-se a partir da fluência e integração de cada falante no meio social, pois, sendo um processo contínuo de aprendizagem tende a funcionar-se de maneira variável o que mostrará a particularidade do locutor em adequá-la de acordo com o tempo e espaço. Essa abordagem, numa acepção dialética, Konder (2004, p. 8) enfatiza os ideais de Heráclito (aprox. 540-480 a.C.): “Nos fragmentos deixados por Heráclito pode se ler que tudo existe em constante mudança, [.] que um homem não toma banho duas vezes no mesmo rio”. Assim, faz-se uma conexão entre a teoria filosófica de Heráclito e a dinamicidade do vocábulo no discurso: já que tudo está em constante mutação, com a língua falada não seria diferente, sua representação está ligada a fatores históricos e atuais, corresponde à realidade em que seu usuário se encontra, ou seja, uma mesma palavra pode ser expressa de várias formas pelo mesmo falante. Essa manifestação lingüística ocorre a todo instante e “quando você consegue identificar os traços característicos de um determinado modo de falar a língua, você pode chamá-lo de variedade”. (BAGNO, 2005, p. 42) O que determina um discurso consciente e ideológico são as variantes internas e externas da língua. Veja a abordagem de Mol ica & Braga (2004, p. 11):
No conjunto de variáveis internas, encontram-se os fatores de natureza
fono-morfo-sintáticos, os semânticos, os discursivos e os lexicais. Eles
dizem respeito a características da língua em várias dimensões, levando-se
em conta o nível do significante e significado, bem como os diversos
subsistemas de uma língua. No conjunto de variáveis externas à língua,
reúnem-se os fatores inerentes ao indivíduo [.], os propriamente sociais
[.] e os contextuais [.]. os do primeiro tipo referem-se a traços próprios
aos falantes, enquanto os demais a características circunstanciais que ora
envolvem o falante, ora o evento de fala.
2.5 DIGLOSSIA: LÍNGUA FALADA E LÍNGUA ESCRITA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO Segundo Bagno (2005, p.163), o Brasil apresenta um problema de Diglossia, ou seja, “palavra que vem do grego e significa ‘duas línguas’”, cuja funcionalidade serve para “designar uma situação em que duas línguas são usadas ao mesmo tempo por uma mesma comunidade de falante, sendo que uma delas em geral tem um status sociocultural mais prestigioso que a outra”. Sabe-se a gramática deixou de fora a língua falada e criou-se então uma língua de status, falada por poucos, ou seja, pelos literatas clássicos. Isso acontece com a língua brasileira pela população não utilizar o português de Portugal. Para Bagno (1999, p. 16) falar o português de Portugal seria impossível: “Ora, a verdade é que no Brasil, embora a língua falada pela grande maioria da população seja o português, esse português apresenta um alto grau de diversidade e de viabilidade [.]”. As diversidades encontradas no Brasil se dão pelo seu enorme extensão territorial e pelo processo de colonização apresentada na década de 80 por Gregory Guy (apud CARDOSO, 1996, p. 19-43):
.as características do português popular do Brasil seriam resultantes de,
primeiramente, um processo de crioulização, iniciado a partir do século
XVII com a escravidão, e, posteriormente, se seguira com um processo de
Com a crioulização e a junção das línguas já existentes, houve várias transformações que diferenciavam o português do Brasil com o de Portugal padronizado. Outra consideração desta distância do português europeu e do português brasileiro seria o diferente tipo de valores, que estariam modificando a “língua falada”. Para Celso Cunha (apud CARDOSO, 1996, p. 69-78):
.de um lado estão os centros urbanos, pequenos e fechados, com um
sistema de valores rigidamente conservador em torno do padrão lingüístico
da metrópole; nas demais regiões do país, a língua sofria profundas
mudanças, influenciadas por um extenso contato com línguas indígenas e
africanas, em situações tipicamente de crioulização.
A linguagem padrão, também sofre influências pelo regionalismo, ocorrido muitas vezes pelo êxodo-rural. Como diz Taral o (apud CARDOSO, 1996, p. 69-78):
.a formação da língua no interior do país acaba por interferir também no
panorama moderno das grandes cidades, em função do massivo
deslocamento do campo para a cidade que se verifica ao longo desse
século, o que neste caso, se confirmaria a tendência de afastamento do
padrão, porém limitado pelo sistema de valores mantidos pelos segmentos
Percebe-se que há um distanciamento da norma culta proveniente desse processo de desenvolvimento e dinamização dos grandes centros urbanos, que quebram o sistema de valores rígidos e fechados do padrão dos modelos europeus, como vigorou no século passado, que apresenta no sistema lingüístico vigente. A diglossia fica bem mais clara na relação entre a língua escrita e na língua falada, para Perini (2003, p. 36):
.há duas línguas no Brasil: uma que se escreve (e que recebe o nome de
“português”); e outra que se fala (e que é tão desprezada que nem tem
nome). E é esta última que é a língua materna dos brasileiros; a outra (o
“português”) tem de ser aprendida na escola, e a maior parte da população
A grande dificuldade dos brasileiros é em escrever corretamente o português de Portugal, obedecendo a regras gramaticais, que não atendem as necessidades da língua falada pelos brasileiros. Esse problema lingüístico do Brasil vem sendo estudado por escritores, gramáticos, historiadores, filólogos e lingüistas. Bagno faz menção de João Ribeiro que em 1921 já afirmava (apud BAGNO, 2005, p. 165):
A nossa gramática não pode ser inteiramente a mesmas dos portugueses.
As diferenciações regionais reclamam estilo e método diversos. A verdade
é que, corrigindo-nos, estamos de fato a mutilar idéias e sentimentos que
nos são pessoais. Já não é a língua que apuramos, é o nosso espírito que
sujeitamos a servilismo inexplicável. Falar diferente não é errado. A
fisionomia dos filhos não é a aberração teratológica da fisionomia paterna.
Na linguagem como na natureza, não há igualdades absolutas; não há,
pois, expressões diferentes que não correspondam também a idéias ou a
sentimentos diferentes. Trocar um vocábulo, uma inflexão nossa por outra
de Coimbra é alterar o valor de ambos a preço de uniformidades artificiosas
Essa distância da língua fadada e da língua escrita faz parte da estrutura de Língua do Brasil, apresentando um sistema de diglossia entre os seus falantes. A linguagem culta sempre valorizou a literatura dos clássicos que seria a forma correta de se falar e escrever. Terra (1997, p.44) resume:
O critério comumente adotado no Brasil para se estabelecer qual seria a
linguagem padrão é o histórico-literário. Histórico porque baseado num uso
passado (a norma não estabelece como “se diz”, mas como “foi dito”) e
literário porque tomou-se como referência o uso escrito de autores
literários. Portanto, aquela linguagem que se estabeleceu como culta
representa o uso de alguns escritores considerados clássicos fizeram da
No Brasil, a escolha de um uso para transformá-lo em norma levou muito
em conta a produção escrita de autores portugueses (Eça de Queirós,
Alexandre Herculano, Camilo Castelo Branco, Almeida Garrett, entre
A literatura brasileira também contribuiu para a identidade da língua brasileira favorecendo com uma linguagem regional rompendo com as estruturas clássicas.
A língua utilizada pelos escritores brasileiros, proporcionou nesse processo de identidade da língua brasileira uma independência literária, em que todos poderiam ter acesso, pois a linguagem européia é artificial valorizando a cultura Lusitânia. Segundo Carlos Alberto Faraco (apud BAGNO, 2003, p. 83):
a lusitanização progressiva da norma escrita, num período de 65 a 70 anos
[1824-1894], se encaixa perfeitamente no projeto político da elite brasileira
pós-independência de construir uma nação branca e europeizada, o que
significava, entre outros muitos aspectos, distanciar-se e diferenciar-se do
vulgo [.], isto é, da população etnicamente mista e daquela de
ascendência africana, que constituíam, sem dúvida, um estorvo grande
Percebe-se que o projeto político da época valorizava a linguagem escrita da elite e que a língua falada pelos africanos e negros, ficava a margem de uma língua sem
valor. A diglossia no Brasil se deu devido às misturas de falares africanos, negros e indígenas e o projeto político não registrou as transformações ocorridas. Diante disso, como valorizar a língua falada no Brasil depois de tantas mudanças? Bagno utiliza as palavras de D. Lucchesi (apud, 2003, 173) que visa um novo projeto político para valorizar a “língua Padrão”, do novo “Brasileiro”:
O embate que se trava hoje na sociedade brasileira entre um projeto
político que visa a manter a estabilidade e o desenvolvimento de um
modelo econômico de acumulação e concentração de riqueza e um outro
projeto de reestruturação do modelo econômico vigente visando à
distribuição de renda à promoção do verdadeiro desenvolvimento social do
país se refletirá inexoravelmente no campo dos estudos da linguagem.
Perini (2003, p. 36) nos dá uma nova definição para a língua falada no Brasil: “vamos chamar a língua falada no Brasil de vernáculo brasileiro.”. Para ele, o vernáculo seria o jeito “certo” de falar, valorizando a língua materna dos falantes, pois para ele é diferente do português utilizado na África ou em Portugal. Resume dizendo:
O português e o vernáculo são, é claro, línguas muito parecidas. Mas não
são em absolutamente idênticas. Ninguém nunca tentou fazer uma
avaliação abrangente de suas diferenças; mas eu suspeito que são
diferentes quanto ao português e o espanhol, ou quanto ao dinamarquês e
o norueguês. Isto é, poderiam ser consideradas línguas distintas, se ambas
fossem línguas de civilização e oficialmente reconhecidas.
Mas seno as coisas como são, o vernáculo é simplesmente uma forma
errada de falar português. Só que, para que o vernáculo fosse “errado”,
teria que existir também uma forma “certa” de falar; mas no Brasil não se
Para Perini, as duas línguas existentes no Brasil têm o seu domínio próprio, uma para a fala e outra para a escrita. A linguagem falada não seria “errada”, já que teria que ter uma “certa” para comprovar ao contrário. Sendo assim, a linguagem utilizada no Brasil apresenta uma diglossia diante das suas variações e não bilingüismo, pois nós não falamos o português de Portugal, falamos o português modificado designado de português brasileiro, como foi dito; já a escrita tenta corresponder a estrutura gramatical portuguesa, desconsiderando a escrita brasileira.
Assim, o vernáculo é a linguagem falada utilizada em pelos brasileiros com liberdade de expressão, ao passo que o português lusitano é utilizado na escrita formal, ensinada na escola.
3 CONCLUSÃO O estudo realizado nesse trabalho baseou-se, principalmente, na análise do português brasileiro tendo em vista a gramática tradicional e a língua falada. Com o propósito de reavaliar o ensino da gramática normativa na prática educacional, percebeu-se a desatualização do sistema quanto à nomenclatura exigida na escola, sendo que a realidade mostra uma variedade na fala ocorrida desde o Latim, passando pelas transformações neolatinas, língua portuguesa de Portugal até chegar à língua portuguesa do Brasil modificada também pela crioulização. Logo, percebeu-se que a mistura dessas línguas fez com que difundisse o português brasileiro onde privilegia a fala, defendida pelos sociolingüístas e criticada pela arquitetura normativa. Assim, sabendo que a língua é viva e as mudanças tecnológicas avançam no campo da comunicação, que por sua vez envolve língua falada como instrumento de ascensão social, o português brasileiro mostrou-se conveniente em considerar a oralidade e a escrita como duas línguas que diferenciam as classes sociais. Portanto, revelou-se através dos estudos dos teóricos aqui mencionados que a diglossia brasileira existe concretizando as estratégias do falante em adequar sua gramática internalizada no ato de comunicação: falada ou escrita. 4 REFERÊNCIAS BAGNO, Marcos. A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira. São
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Effectiveness of pharmacologically induced histamine release in the SERGIO DE LA TORRE PÉREZ GUILHOU AND GABRIEL DE ERAUSQUIN Basophile leukocytes and mastocytes are the main effectors of the hypersensitivity mediated by immunoglobulin E, or f the type I, and they have an important role in protection against viral infections. This form oh hypersensitivity is clinically manifested by mean
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